Inquisição: mentiras e verdades que ainda escandalizam

Há ainda quem fique escandalizado quando católicos desmentem lendas midiáticas contra a Igreja Católica. Uma dessas lendas obviamente é a questão da Inquisição. Mas que verdades parecem de fato escandalizar?

O blogueiro Julio Severo costumeiramente se revolta com qualquer menção ao assunto, tentando sempre equiparar a Inquisição ao Holocausto e veladamente chamando católicos de nazistas. Com sua já tradicional retórica falaciosa, (que deve envergonhar a grande maioria dos protestantes) procura fazer um tipo de linchamento virtual de quem quer que mencione dados históricos que vilipendiem o valioso imaginário popular defendido por ele, depois corroborado por uma literatura histórica seletiva. As citações históricas das quais lança mão têm em comum o erro da dupla descontextualização: ignora o contexto das obras e o contexto do período histórico.

Confunde, de firme propósito, o contexto da mentalidade católica medieval e seus costumes com a instituição da Igreja, ao atribuir à Igreja os crimes cometidos por populares ou pelo estado, contra os quais justamente foi criado o Tribunal da Santa Inquisição. Sua confusão entre Igreja e estado é compreensível. Os países protestantes foram fundados por sociedades profundamente religiosas e é deles a base democrática sob a qual vivemos. Mas sem um magistério eclesiástico de competência estritamente espiritual, sua interpretação das Escrituras parece ter escorregado fatalmente para o âmbito político e, portanto, democrático e popular. O resultado positivo histórico parece ter sido a longa tradição norte-americana de defesa da fé por meio do estado. Mas isso obviamente esbarra em profundos problemas difíceis de resolver.

A Lei de Lynch e o racismo na América

Um dos grandes feitos da Santa Inquisição foi acabar com o costume historicamente consagrado dos linchamentos públicos, algo que remonta à antiguidade. Mas esta cultura da justiça popular permaneceu em algumas partes do mundo, especialmente na Alemanha e Grã Bretanha, onde a Igreja teve pouca influência.  Ganhou seu nome moderno graças à chamada Lei de Lynch, nos Estados Unidos, que permitia a prática do justiçamento contra bandidos e ladrões, mas também escravos fugitivos e defensores dos direitos dos negros, o que deu origem à Klu Klux Klan, historicamente apoiadores do partido Democrata por meio dos chamados “comitês de vigilância”. Para a historiadora norte-americana Amy Louise Wood, a partir de 1880, o linchamento se expandiu também para judeus, índios e imigrantes asiáticos.  A prática do linchamento ficou particularmente associada ao assassinato de negros no sul dos Estados Unidos. Em 1892, 161 negros foram linchados.

Ao contrário dos países católicos em que o Tribunal da Inquisição forneceu normas e princípios jurídicos baseados no direito romano para julgar adequadamente, na América protestante, o meio encontrado para frear este costume bárbaro foi a instituição da pena de morte pelo estado.

Esta é uma verdade sobre os EUA que deveria escandalizar igualmente católicos e protestantes.

Inquisição humanizou o direito penal

Devemos lembrar que a heresia era considerada um crime contra o estado e, por isso, foi o estado que pediu à Igreja que estudasse bases jurídicas para acabar com as condenações arbitrárias e injustas. O resultado mais perceptível ainda hoje é a instituição da penitenciária, originalmente locais onde o apenado cumpria penitências. As penitências representavam o grosso das penalidades impostas a hereges e criminosos. Só mesmo quando o indivíduo insistia em sua justificação, reafirmava hereticamente suas crenças e obstinava-se em confundi-las com as do Cristianismo, era então transferido ao “braço secular”, onde o estado cuidava de sua pena, o que era feito conforme o costume, aí sim de modo bastante bárbaro.

Também é bom lembrar que a Igreja tinha por propósito “salvaguardar a fé dos simples”. Nas palavras do Papa Emérito Bento XVI, “proteger os simples dos intelectuais”, heresiarcas que visavam confundir o povo e levá-los à danação eterna. Foi neste espírito que o então Papa deu um “cala boca” em Leonardo Boff.

Quem odeia a Inquisição?

A histórica propaganda protestante contra a Igreja usou sempre a Inquisição como figura maior, motivo pelo qual temos hoje essa imagem sobre o tema, criados por séculos de literatura anti-católica e décadas de filmes norte-americanos de mesmo teor. Mas se fizer uma busca pela internet sobre o assunto, verá também que há inúmeras seitas gnósticas e maçônicas que ecoam estes rumores e revoltam-se, entre outras coisas, com a extinção da seita gnóstica dos cátaros.

Também o neopaganismo crescente no norte da Europa odeia a Igreja Católica especialmente pelo tema da Inquisição. Na Noruega e Suécia, militantes neopagãos queimam igrejas e hostilizam católicos. O tema da Inquisição também é caro às feministas, que chegam a dizer que mulheres inocentes eram queimadas na fogueiras acusadas de serem bruxas, o que comprovaria o “ódio histórico da Igreja às mulheres”.

Evidentemente, houveram excessos como em todos os processos humanos são fatalmente falhos. Não precisamos nem falar dos acertos da inquisição protestante. Para enumerar seus erros, deixamos apenas essa lembrança da sua insistente propaganda que tem sido tão bem usada, não por inimigos dos católicos, mas de todo o cristianismo, para justificarem suas ideologias e seitas. Eis a quem ajudam estes propagandistas do imaginário popular fundido na cosmovisão da revista Super Interessante.

Diz-me a quem ajudas que te direi quem és.

Referências:

WOOD, Amy Louise. Lynching and spectacle : witnessing racial violence in America, 1890-1940. (http://www.worldcat.org/title/lynching-and-spectacle-witnessing-racial-violence-in-america-1890-1940/oclc/701719807/viewport)
AQUINO, Felipe. Uma história que não é contada.
GONZAGA, João Bernardino. A Inquisição em seu mundo.TOCQUEVILLE, Alexis de. Democracia na América.

 

 


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